Desde a sua criação, Lei Antiterrorismo é alvo de disputas entre direita e esquerda

12 de novembro de 2025

Juliano Callegari Melchiori concede entrevista em matéria publicada pelo Jornal O Globo

Um dos principais pontos de polêmica do relatório do deputado Guilherme Derrite (PP-SP) sobre o PL Antifacção, a Lei Antiterrorismo brasileira foi criada às vésperas das Olimpíadas de 2016.

Desde então, a legislação tem sido alvo de disputas entre a esquerda e a direita, ora como instrumento de combate ao extremismo, ora como tentativa de enquadrar movimentos sociais.

Ao longo de quase dez anos, a lei somou tentativas de alterações que foram travadas no Congresso por não serem um consenso entre bolsonaristas e apoiadores do presidente Lula.

Sancionada pela então presidente Dilma Rousseff, a lei foi criada como resposta à pressão exercida pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) às vésperas das Olimpíadas do Rio. Junto com outras organizações internacionais, a entidade exigiu a adequação da legislação brasileira a normas internacionais de combate ao terrorismo, após atentados ocorridos durante as competições, como o Massacre de Munique, em setembro de 1972, com 17 mortos, diz Juliano Melchiori, advogado criminalista especialista em processo penal pela Universidade de Coimbra.

“A aprovação da lei acabou sendo uma resposta política e diplomática e partiu do esforço de segurança exigido para a realização dos Jogos Olímpicos. Nessa época, o Brasil era o único país sul-americano que não havia adequado a sua legislação às recomendações de organizações como o Grupo de Ação Financeira Internacional e o Conselho de Segurança da ONU, que tinham um temor de que o país fosse um território fértil para atentados durante as competições”, diz.

Em resposta, a legislação brasileira passou a tipificar o terrorismo como a prática de “atentar contra pessoa, mediante violência ou grave ameaça, desde que motivado por extremismo político, intolerância religiosa ou preconceito racial, étnico, de gênero ou xenófobo, com objetivo de provocar pânico generalizado”.

No mesmo ano, a norma chegou a ser aplicada no âmbito da Operação Hashtag, deflagrada pela Polícia Federal. Horas antes da abertura dos Jogos Olímpicos, a ação policial prendeu dez suspeitos acusados de manterem ligações com o grupo terrorista Estado Islâmico e planejarem, por meio das redes sociais, um ataque contra integrantes da delegação francesa.

A motivação por trás da atuação dos grupos enquadrados na lei voltou a ser debatida em 2021, quando a Câmara discutiu um projeto de autoria do deputado Major Victor Hugo (PL-GO).

Apresentada em 2019 com o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro, a proposta previa a criação de um Sistema Nacional Contraterrorista, subordinado às Forças Armadas, e expandia a definição de atos terroristas para “movimentos contestatórios de outras naturezas”.

Na época, a medida foi criticada pela oposição, que argumentou que a mudança deixaria brechas para a inclusão de movimentos sociais que manifestavam contra o governo, e acendeu o alerta do Escritório de Direitos Humanos da ONU na América Latina. A mudança foi assunto de uma comissão especial da Câmara, mas teve a urgência negada.

O tema também foi assunto na pré-campanha de 2022, quando Bolsonaro enviou ao Congresso uma proposta para que a definição prevista na lei passasse a contemplar ações violentas com fins políticos ou ideológicos, retomando a brecha para a criminalização de movimentos sociais.

Outro viés
Ao final do seu governo, no entanto, a discussão entrou em pauta pelas mãos de seus adversários políticos a partir de um texto apresentado pelo senador Alessandro Vieira (MDB). Após a invasão das sedes dos três Poderes no 8 de Janeiro, o parlamentar propôs que as motivações políticas fossem incluídas como justificativas para o enquadramento na Lei Antiterrorismo. A proposição, no entanto, segue parada há dois anos na comissão de Defesa da Democracia.

A legislação voltou ao centro do debate agora com O relatório de Derrite sobre o PL Antifacção. Em sua primeira versão, o parecer equiparava as penas por crimes cometidos por organizações criminosas com os de grupos terroristas.

“Pela descrição feita, a finalidade dos grupos terroristas é desestabilizar, ao passo que uma organização criminosa, facção ou milícia, depende da estabilidade no território em que elas querem ocupar para fazer dinheiro e lucrar a longo prazo”, diz o professor de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV- Rio) Thiago Bottino.

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